Uma coisa que eu sempre tenho perto de mim onde eu estiver é um livro, ultimamente com o corre corre do dia a dia ando sem tempo para me deliciar com uma longa história então ultimamente tenho levado comigo um bom livro de contos. Adoro contos. Por diversos motivos os livros de contos estão na lista do meus favoritos .Eles são ótimos companheiros. Servem pra quando você está com pouco tempo, sem muito fôlego com algum romance, no meio de alguma gigantesca biografia, no marasmo de um livro técnico... O livro de contos é aquele parceirinho que te dá um gás. Da mesma família também estão os livros de crônicas que eu tb amo.
Recentemente li um especial que encontrei por acaso em uma charmosa livraria de Novos e usados no bairro do Catete.O livro chama-se "Contos de Vista" a autora é ninguém menos que Elisa Lucinda artista q eu curto demais.A Capa assim como o titulo é bem convidativa , um closer nos olhos verdes da autora.
Pois bem ainda sobre o livro é deliciosa a viagem a escrita leve de Elisa e a forma como as histórias são retratadas. Contos de Vistas narra histórias vistas e vividas pela própia autora e são de situações que encontramos a cada esquina mas nem percebemos.O meu favorito é "Amor pelos desfechos" que conta a história de um taxista.Essa figura tão comumente vista e eu ainda não o tinha visto como elemento tão importante para tantas histórias acontecerem enfim não vou contar leiam que é muito legal.
Com Vcs de Elisa Lucinda : Amor pelos Desfechos
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Chuvinha fina porém decidida, eu entro no taxi mandado a me buscar e que me aguardava à porta de casa, já há uns quinze minutos.
- Boa noite, aonde vamos? Perguntou o motorista.
- Não sei, o senhor não sabe?
- Essa é boa: é a primeira vez que pego uma passageira que não sabe para aonde vai! Vou te contar...
- Peralá, o senhor foi contratado para me levar para uma corrida para a qual já foi até pago... e não sabe?
- Não senhora. A empresa apenasmente me bipa e eu venho no endereço. Certo?
- Bem, o que eu sei é que vamos para São Conrado na casa de Ana Carolina, a can..
- A cantora? Pô essa mulher é fera! E como é que a gente chega lá?
- Ana Carolina? (Eu já de celular em punho falando com a própria) Como é que eu fáço pra chegar aí.., etc e tal... patatipatatá?...
- Mas essa menina canta muito bem. Aliás, essa música que está tocando aí dela na novela é uma versão boa, mas a primeira foi a do José Augusto. Sabe quem é? "Agora agüenta, coração..."
- Sei, mas eu não conheço a versão dele pra essa música que a Ana gravou com a versão dela.
- Ah, é muito bonita! Quer ouvir?
Pois não é que Marcos (era esse o nome dele) sacou de seu CD, o melhor de José Augusto e o colocou no excelente som de seu carro imediatamente? Seguimos na estrada ouvindo aquela breguice; ele preferia a dele, eu disparadamente a dela e a conversa vai até quando éramos pequenos, cada um no seu mundo, o gosto pela musica já aparecendo na infância e coisa e tal. A conversa seguia boa até que ele perguntou:
- Será que Ana Carolina sabe que existe outra versão dessa música?
- Não sei, mas eu vou contar a ela.
- JURA?
- Juro.
- Vai dizer que eu mostrei o disco e tudo?
- Claro, vou contar a estória desde a hora em que ainda não sabíamos para onde íamos.
A chuva caía lá fora e à noite, São Conrado me parece mais longe e mais desconhecido. Vamos seguindo errando ali, entrando na possível rua acolá, adivinhando uma esquina, a cor vermelha do edifício, conforme a própria dona da casa havia me dito pelo telefone, parecia ser num outro bloco mais adiante.
- Quer dizer que a senhora vai contar a ela o assunto dessa nossa corrida? Que eu sou fã dela e tudo?
- Claro que eu vou!
- É, a gente fica pensando... Será que ela vai gostar de saber?
- Talvez ela já saiba. Mas uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa.
- Mas dá vontade de ser uma mosquinha a assistir tudo o que vai acontecer lá quando você contar. Não é que eu seja curioso não, sabe?
- Não, você e uma espécie de enxerido científico, eu entendo.
- É, essa que a é a tristeza do motorista de táxi.
- Qual tristeza, Marcos?
- A gente nunca sabe o final. É sempre assim, essa agonia: "Moço, pelo amor de Deus, toca pro Santos Dumont que eu tenho que pegar esse avião que sai em vinte minutos. Lá em São Paulo um cara vai estar me esperando no aeroporto, e de lá nós vamos para uma reunião que, dependendo do resultado, eu vou poder me separar da Odete e casar com a Patrícia. Eu nem acredito! Deus me ajude. Corre, moço!". Aí você pisa firme, toma até multa, mas deixa o cara no destino dele. E a parte deles com a gente só vai até "obrigado" ou "valeu" e a nossa com eles até o "boa sorte".
- E você fica pensando nos possíveis finais?
- Fico. Será que ele pegou o avião? Será que perdeu, chegou lá não havia ninguém esperando em Sampa porque ficou muito tarde e ele não pode resolver o negócio para se divorciar de Odete e casar com Patrícia, meu Deus?
- Você tem razão. Porque você com seu serviço, passa ser um personagem na trama. Um personagem cuja ação é decisiva para o desfecho.
- Pois é. E quando a gente leva pessoa quase parindo? Ah, nossa senhora! Quando a gente chega lá e deixa a passageira e os parentes, ah! Dá vontade de entrar no hospital, sabe? Saber notícia, esperar um pouco só para esticar o ouvido e escutar um marido dizendo: "É uma menina como a mãe queria!" Sei lá, eu falando assim pareço um cara intrometido... Mas...
- Mas não é. Você é um cara solidário, é diferente. Você se envolve com a estória do outro que está ajudando a contruir com sua ação. Você considera a vida do outro, você se importa com o outro. Sua curiosidade é uma certa compaixão pelo outro e quer acompanhar o desenrolar dos fatos depois que você o deixa.
Chuvinha fina porém decidida, eu entro no taxi mandado a me buscar e que me aguardava à porta de casa, já há uns quinze minutos.
- Boa noite, aonde vamos? Perguntou o motorista.
- Não sei, o senhor não sabe?
- Essa é boa: é a primeira vez que pego uma passageira que não sabe para aonde vai! Vou te contar...
- Peralá, o senhor foi contratado para me levar para uma corrida para a qual já foi até pago... e não sabe?
- Não senhora. A empresa apenasmente me bipa e eu venho no endereço. Certo?
- Bem, o que eu sei é que vamos para São Conrado na casa de Ana Carolina, a can..
- A cantora? Pô essa mulher é fera! E como é que a gente chega lá?
- Ana Carolina? (Eu já de celular em punho falando com a própria) Como é que eu fáço pra chegar aí.., etc e tal... patatipatatá?...
- Mas essa menina canta muito bem. Aliás, essa música que está tocando aí dela na novela é uma versão boa, mas a primeira foi a do José Augusto. Sabe quem é? "Agora agüenta, coração..."
- Sei, mas eu não conheço a versão dele pra essa música que a Ana gravou com a versão dela.
- Ah, é muito bonita! Quer ouvir?
Pois não é que Marcos (era esse o nome dele) sacou de seu CD, o melhor de José Augusto e o colocou no excelente som de seu carro imediatamente? Seguimos na estrada ouvindo aquela breguice; ele preferia a dele, eu disparadamente a dela e a conversa vai até quando éramos pequenos, cada um no seu mundo, o gosto pela musica já aparecendo na infância e coisa e tal. A conversa seguia boa até que ele perguntou:
- Será que Ana Carolina sabe que existe outra versão dessa música?
- Não sei, mas eu vou contar a ela.
- JURA?
- Juro.
- Vai dizer que eu mostrei o disco e tudo?
- Claro, vou contar a estória desde a hora em que ainda não sabíamos para onde íamos.
A chuva caía lá fora e à noite, São Conrado me parece mais longe e mais desconhecido. Vamos seguindo errando ali, entrando na possível rua acolá, adivinhando uma esquina, a cor vermelha do edifício, conforme a própria dona da casa havia me dito pelo telefone, parecia ser num outro bloco mais adiante.
- Quer dizer que a senhora vai contar a ela o assunto dessa nossa corrida? Que eu sou fã dela e tudo?
- Claro que eu vou!
- É, a gente fica pensando... Será que ela vai gostar de saber?
- Talvez ela já saiba. Mas uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa.
- Mas dá vontade de ser uma mosquinha a assistir tudo o que vai acontecer lá quando você contar. Não é que eu seja curioso não, sabe?
- Não, você e uma espécie de enxerido científico, eu entendo.
- É, essa que a é a tristeza do motorista de táxi.
- Qual tristeza, Marcos?
- A gente nunca sabe o final. É sempre assim, essa agonia: "Moço, pelo amor de Deus, toca pro Santos Dumont que eu tenho que pegar esse avião que sai em vinte minutos. Lá em São Paulo um cara vai estar me esperando no aeroporto, e de lá nós vamos para uma reunião que, dependendo do resultado, eu vou poder me separar da Odete e casar com a Patrícia. Eu nem acredito! Deus me ajude. Corre, moço!". Aí você pisa firme, toma até multa, mas deixa o cara no destino dele. E a parte deles com a gente só vai até "obrigado" ou "valeu" e a nossa com eles até o "boa sorte".
- E você fica pensando nos possíveis finais?
- Fico. Será que ele pegou o avião? Será que perdeu, chegou lá não havia ninguém esperando em Sampa porque ficou muito tarde e ele não pode resolver o negócio para se divorciar de Odete e casar com Patrícia, meu Deus?
- Você tem razão. Porque você com seu serviço, passa ser um personagem na trama. Um personagem cuja ação é decisiva para o desfecho.
- Pois é. E quando a gente leva pessoa quase parindo? Ah, nossa senhora! Quando a gente chega lá e deixa a passageira e os parentes, ah! Dá vontade de entrar no hospital, sabe? Saber notícia, esperar um pouco só para esticar o ouvido e escutar um marido dizendo: "É uma menina como a mãe queria!" Sei lá, eu falando assim pareço um cara intrometido... Mas...
- Mas não é. Você é um cara solidário, é diferente. Você se envolve com a estória do outro que está ajudando a contruir com sua ação. Você considera a vida do outro, você se importa com o outro. Sua curiosidade é uma certa compaixão pelo outro e quer acompanhar o desenrolar dos fatos depois que você o deixa.
- Você é psicóloga? - Não, sou escritora e atriz.
- Ah, então também aprecia o roteiro da vida, né?
- Se é, vivo que nem você, pensando nos enredos. No meu e nos dos outros. Estou terminando agora meu livro de contos, meu primeiro livro de prosa e tem uma parte dele que se chama "Uma escuta Passageira" que são algumas das inúmeras estórias que os motoristas de taxi me contam. São maravilhosas. Isso dá a maior parceria pro meu pensamento.
- E o livro está no computador?
- Não, está aqui na pasta. Estou revisando e vou levar pra mostrar um conto que a Ana Carolina vai dizer no Canecão.
- Deixa eu ver? É isso que eles chamam de originais?
- Tá falando com eles. - Puxa, que honra! Que dia esse o meu! Aqui acontece de um tudo. E se a gente contar parece mentira. - Parece ficção. Isso sim.
- Bem chegamos. Acho que é aqui sim. Ela disse o único prédio vermelho.
- Tchau, obrigada, bom trabalho.
- Tchau. Boa Sorte.
Nos despedimos no de sempre quando me voltei ainda, sob a chuvinha já mais fina, eu já quase entrando no edifício, gritei:
- Marcos?
- Sim?
- Você quer saber o final?
Os olhos dele brilhavam como os de uma criança que finalmente toca naquela bola querida.
- Claro que quero! É tudo o que eu quero!
- Então vem me buscar!
LUCINDA, Elisa. “Amor pelos desfechos”. In: Contos de vista. São Paulo, SP: Global, 2004, pp. 40-45.
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